por F. Solano Portela Neto
Em 31 de outubro de
1517, Martinho Lutero pregou as suas hoje famosas 95 Teses na porta da catedral
de Wittenberg. Periodicamente as igrejas evangélicas relembram aqueles eventos
que, na soberana providência de Deus, preservaram viva a Sua Igreja. Muitos, entretanto,
questionam essas comemorações e alguns chegam até a contestar a lembrança da
Reforma. "Por que considerar o que aconteceu há quase 500 anos?"
Seguramente, muitos não
estudam a Reforma por mero desconhecimento do fato, por falta de informação ou
por não se aperceberem da sua importância na vida da Igreja e da humanidade.
Outros há que procuram um esquecimento voluntário daqueles eventos do século
XVI. Martin Lloyd-Jones nos fala que entre aqueles que rejeitam a memória da
Reforma temos, basicamente, dois tipos de argumentação: 1º) Dos que dizem que o
passado nada tem a nos ensinar; e 2º) Dos que vêem a Reforma como uma tragédia
na história religiosa da humanidade. Para os primeiros, somente o progresso
científico e o futuro nos interessam. Firmadas em uma mentalidade
evolucionista, estas pessoas partem para uma abordagem histórica de que o
presente é sempre melhor do que o passado. Eles nada enxergam na história que
possa nos servir de lição, apoio, ou alerta. Já para os segundos, devemos
estudar a unidade e não um movimento que trouxe a divisão e o cisma ao
cristianismo. Para eles, perdemos tempo quando nos ocupamos de algo "tão
negativo".
Podemos dar graças,
entretanto, pelo fato de que um segmento da Igreja ainda acha importante
relembrar e aplicar as questões levantadas pelos Reformadores. Contudo, o mesmo
Martin Lloyd-Jones alerta para um perigo que ainda existe no interesse pelos
acontecimentos que marcaram o século XVI. Na realidade, ele nos confronta com
uma forma errada e uma forma certa de relembrar o passado, do ponto de vista
religioso.
A forma errada seria
estudar o passado por motivos meramente históricos. Esse estudo seria
semelhante à abordagem que um antiquário dedica a um objeto. Por exemplo,
quando ele examina uma cadeira, não está interessado se ela é confortável, se
dá para sentar-se bem nela, ou se ela cumpre adequadamente a sua função de
cadeira. Basicamente, a preocupação se resume à sua idade, ao seu estado de
conservação e, principalmente, a quem ela pertenceu. Isso determinará o valor
daquele objeto para o antiquário e motivará o seu estudo.
Em Mateus 23:29-35
teríamos um exemplo dessa abordagem errada do passado. O trecho diz:
Ai de vós, escribas e
fariseus, hipócritas, porque edificais os sepulcros dos profetas, adornais os túmulos
dos justos e dizeis: Se tivéssemos vivido nos dias de nossos pais, não teríamos
sido seus cúmplices no sangue dos profetas! Assim, contra vós mesmos,
testificais que sois filhos dos que mataram os profetas. Enchei vós, pois, a
medida de vossos pais. Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da
condenação do inferno? Por isso, eis que eu vos envio profetas, sábios e
escribas. A uns matareis e crucificareis; a outros açoitareis nas vossas
sinagogas e perseguireis de cidade em cidade; para que sobre vós recaia todo o
sangue justo derramado sobre a terra, desde o sangue do justo Abel até ao
sangue de Zacarias, filho de Baraquias, a quem matastes entre o santuário e o
altar.
Jesus diz que aqueles
homens pagavam tributo à memória dos profetas e líderes religiosos do passado.
Eles prezavam tanto a história que cuidavam dos sepulcros e os enfeitavam,
proclamavam a todos que os profetas eram homens bons e nobres, e atacavam quem
os havia rejeitado. Diziam eles: "se estivéssemos lá, se vivêssemos naquela
época, não teríamos feito isso!" Mas Jesus não Se impressiona e os chama
de hipócritas! A argumentação de Jesus é a seguinte: Se vocês se dizem
admiradores dos profetas, como é que estão contra aqueles que representam os
profetas e proclamam a mesma mensagem que eles proclamaram? Jesus testou a
sinceridade deles pondo a descoberto a atitude que mantinham contra aqueles que
pregavam a mensagem de Deus e mostra que eles próprios seriam perseguidores e
assassinos dos proclamadores da mensagem dos profetas de Deus.
Esse é também o nosso
teste: Alguém pode olhar para trás e louvar homens famosos, mas isso pode ser
pura hipocrisia se não aceitar, no presente, aqueles que pregam a mensagem de
Lutero e de Calvino. Somos mesmo admiradores da Reforma promovida por aqueles
grandes profetas de Deus?
Mas existe uma forma
correta de relembrar o passado. Ela pode ser deduzida não apenas por exclusão e
inferência do texto anterior, mas principalmente da passagem de Hebreus 13:7-8,
que diz:
Lembrai-vos dos vossos
guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o
fim da sua vida, imitai a fé que tiveram. Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo
e o será para sempre
A maneira correta de
relembrar a Reforma é, portanto, verificar a mensagem, a Palavra de Deus como
foi pregada; e isso não apenas por um interesse histórico de
"antiquário", mas com o bom propósito de imitar a fé ali demonstrada.
Devemos observar esse evento e aqueles homens, para aprender e seguir os seus
exemplos, discernindo a sua mensagem e aplicando-a aos nossos dias.
FONTE: (Publicado em O Presbiteriano Conservador na edição de Setembro/Outubro de 1997)
retirado de http://www.monergismo.com/
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